A Bíblia e a Ciência

A Bíblia não é um manual científico; ela não pretende ensinar-nos química, físico, biologia, botânica, astronomia etc. Entretanto, cremos que o que ela diz no campo científico, como em qualquer outro, é a verdade do ponto de vista fenomenológico, não havendo divergência real entre a genuína ciência e a correta interpretação da Palavra. Deus é o Senhor de toda a verdade. Portanto, nossa compreensão bíblica é determinada pela revelação de Deus nas Escrituras; não interpretamos a Bíblia simplesmente à luz da história, ou de seus condicionamentos políticos, sociais, econômicos e culturais; antes, olhamos a história a partir da perspectiva das promessas divinas.

Acreditamos na coerência de toda a realidade, aceitamos até mesmo o que as Escrituras dizem sobre o pecado. A ciência genuína nunca nos afastará de Deus. Ela só encontrará pleno sentido no seu Senhor e para onde todo o real converge e encontra seu verdadeiro significado. Aliás, como bem acentuou Herman Bavinck (1854-1921):

Qualquer ciência, filosofia ou conhecimento que suponha poder firmar-se em suas próprias pressuposições, deixando Deus de fora de suas considerações, transforma-se em seu próprio opositor e desilude a todos que constroem suas expectativas nisto. [1]

Portanto, não temos medo dos fatos, porque sabemos que provêm de Deus; nem tememos pensar, porque sabemos que toda verdade procede de Deus. A razão corretamente conduzida e o exercício da genuína ciência não oferecem perigo à fé, antes, são suas aliadas. Contudo, devemos estar atentos isto: as Escrituras não se propõem a fazer ciência. Calvino destacou isso ao comentar Gênesis 1:14: “É necessário relembrar que Moisés não fala com agudez filosófica sobre os mistérios ocultos, porém relata aquelas coisas que em toda parte observou, e que igualmente são comuns aos homens simples” [2]. Inspirando por Deus, Moisés escreveu do ponto de vista fenomenológico, sem a preocupação – e este não era seu objetivo – de registrar os fatos com terminologia científica.

Na hipótese de Moisés ter escrito conforme os padrões científicos de sua época – o que não ocorreu, e isso é impressionante, pois ele rompeu com sua primorosa formação egípcia -, certamente o que disse seria ridicularizado hoje. Em contrapartida, se tivesse redigido o relato da criação com rigor cientifico absoluto, dificilmente entenderíamos o que teria dito. As Escrituras continuariam sendo ridicularizadas nesse caso simplesmente por nossa ignorância científica. A linguagem descrita dos fatos conforme se apresentam à nossa percepção é o melhor modo de tornar algo compreensível a todas as épocas; assim, Deus se designou fazer e o fez. Calvino afirma:

Moisés registra que foi acabada a terra e acabados os céus, como todo o exército deles (Gn 2.1). Que vale ansiosamente indagar em que dia, à parte das estrelas e dos planetas, hajam também começado a existir os demais exércitos celestes mais recônditos, quais sejam os anjos? Para não alongar-me em demasia, lembremo-nos neste ponto, com em toda a doutrina da religião, de que se deve manter a só norma de modéstia e sobriedade, de sorte que, em se tratando de cousas obscuras, não falemos, ou sintamos, ou sequer almejemos saber, outra cousa que aquilo que nos haja ensinado na Palavra de Deus. Ademais, impõe-se, ainda, que no exame da Escritura nos atenhamos a buscar e meditar continuamente aquelas cousa que dizem respeito à edificação, nem cedamos à curiosidade, ou à investigação de cousas inúteis. E, porque o Senhor nos quis instruir não em questões frívolas, mas na sólida piedade, no temor do Seu nome, na verdadeira confiança, no deveres da santidade, contentemos-nos com este conhecimento [3].

Charles Hodge (1797-1878), teólogo calvinista americano afirmou:
[Deus] não ensinou astronomia ou química aos homens, porém ele deu-lhes os fatos externos sobre os quais aquelas ciências são construídas. Tampouco ensinou-nos teologia sistemática, porém ele deu-nos na Bíblia as verdades que, propriamente compreendidas e organizadas, constituem a ciência da Teologia [4].


Autor: Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

Fonte: Fundamentos da teologia reformada, pg. 49- 51

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